Amanhã,
A tristeza vai transformar-se em alegria,
E o sol vai brilhar no céu de um novo dia,
Vamos sair pelas ruas, pelas ruas da cidade,
Peito aberto,
Cara ao sol da felicidade.
Construir o movimento estudantil cotidianamente é tarefa de muitos; de todos que se preocupam com os rumos da Universidade e de nosso país, que acreditam que a Universidade não deve ser de uma minoria, que defendem um ambiente livre para a livre produção de conhecimento, que querem uma Universidade mais povo, mais operária, mais camponesa, mais negra, mais mulher.
É por isso que existimos e nos organizamos; por acreditarmos ser possível colocar a Universidade em Movimento. A USP é a universidade mais elitista do Brasil, além de ter uma estrutura de poder arcaica e antidemocrática que possibilita à Reitoria administrá-la como bem entende. Essa é uma estrutura que precisa ser transformada, mas isso só acontecerá se atuarmos coletivamente, agregando mais estudantes que, assim como nós, estão em seus cursos e seus campi acreditando ser possível fazer um movimento estudantil diferente.
Como é a descrição no próprio site do DCE, “o Diretório Central dos Estudantes da USP, DCE Livre Alexandre Vannucchi Leme, é a entidade representativa dos estudantes tanto dos campi da capital como dos campi do interior, com a função de organizar e de expressar as vontades, anseios e posições políticas dos estudantes”. É com foco na ideia de organizar os estudantes que pensamos a necessidade de o DCE estar sempre ligado às entidades de base (Centros Acadêmicos) para atuar de maneira plural, ampla e levando sempre em conta as diversas realidades dos cursos da USP.
Nos lançamos com 64 integrantes dispostos a tocar a gestão do DCE. Acreditamos que esse número seja suficiente, e preferimos não inflar nossa chapa com o nome de pessoas que, na prática, serão nossos apoiadores. Além disso, cremos que uma gestão não funciona se os Cas e todos os estudantes não construírem o Movimento Estudantil cotidianamente – ou seja, o bom andamento de uma gestão não depende de um grande número de integrantes.
Vinculada à eleição de DCE está a eleição para Representantes Discentes (RDs). Estes são os estudantes que participam e atuam nos órgãos colegiados centrais da USP, como o Conselho Universitário, o Conselho de Graduação e o de Pós-Graduação , e as Comissões Permanentes da Universidade – como a de Legislação e Recursos. Os RDs são fundamentais para travar um diálogo entre as instâncias da universidade e os alunos. Ainda que sejam poucas as nossas cadeiras, não podemos deixar de preenchê-las, de participar das reuniões e de atuar conjuntamente com os servidores docentes e técnicos-administrativos.
Os métodos do movimento estudantil
Pensamos a democracia como uma determinada vivência política, algo que não se resume à estrutura de poder dos espaços (in)disponíveis. Com essa concepção, consideramos que, para reivindicar democracia na universidade, o movimento estudantil deve, também, ser democrático, carregando o diálogo e a prática da unidade como premissas fundamentais, que vão além de um discurso bonito e facilmente bem recebido. Para que não nos contentemos com palavras de ordem, é preciso entender para que serve o DCE – ou para que deveriam servir as entidades representativas do Movimento Estudantil, como o DCE e os CAs.
Nesse sentido, é fundamental que entendamos, em primeiro lugar, que a força de nosso movimento reside justamente no nosso número e na nossa capacidade de mobilização. Somos diferentes grupos, diferentes opiniões, e é papel das entidades articular essas pessoas – seja buscando consensos entre posições divergentes, seja aproximando lutas semelhantes de lugares distantes. O que se vê hoje, ao contrário, são coletivos disputando a direção do movimento e que muitas vezes confundem mobilizar e politizar os estudantes com atraí-los para seus coletivos. Ora, é natural que existam grupos políticos diversos atuando na universidade e que defendam diferentes atuações, mas é a atuação em frentes unitárias, e não a luta fratricida, que gera força para o movimento estudantil.
Articular os Centros Acadêmicos
O Conselho de Centro Acadêmicos (CCA) é um espaço com um potencial muito grande para fortalecer e ampliar as relações entres os CAs, fortalecendo, assim, o movimento estudantil como um todo, tornando-o mais coeso e orgânico. Para isso, no entanto, é necessário que o CCA seja construído de maneira democrática: (i) ele precisa ser, além de periódico (no caso, mensal), rotativo, para que estimule a participação de todos os CAs e não apenas dos da capital; (ii) a pauta deve ser encaminhada com antecedência de, no mínimo, duas semanas, para os CAs terem tempo de debater nos cursos, com os estudantes, a fim de levar posicionamentos mais representativos de sua base; (iii) se a gestão do DCE for apresentar propostas de encaminhamento, essas propostas devem ser enviadas previamente para os CAs também, de modo que nenhum debate seja feito sem consulta prévia aos estudantes, que são, afinal, meio e fim de nosso movimento.
Acima de tudo, o CCA deve ser um espaço que abarque a diversidade do movimento estudantil da USP. Porque mais importante do que a aprovação ou não das propostas de um ou de outro grupo é o movimento caminhar junto, lado a lado. O CCA é fundamental, porque acreditamos que o movimento estudantil da USP só será forte se os Centros Acadêmicos de cada curso estiverem integrados à realidade de seus cursos, conhecendo os estudantes e construindo movimentações que façam sentido para todos. O Encontro de Centros Acadêmicos (EnCA), é um espaço privilegiado para a troca de experiências e para formação política; ele deve ser construído pelo conjunto dos CAs, visando a responder os desafios que encontram no dia a dia de sua prática.
Articular os estudantes
Acreditamos que um DCE verdadeiramente representativo precisa conhecer as diferentes realidades dos diversos cursos e campi da USP – ou seja, é preciso ir além da FFLCH e do Butantã, e abarcar todos e todas em um movimento aberto e plural. Com isso em vista, consideramos essencial reconhecer o movimento político que há fora das atuações do tal “movimento estudantil”, entendido como à parte da maioria dos estudantes. Debates que ocorreram na FEA sobre a instalação de catracas, por exemplo, são parte daquela realidade, e devem ser encarados com a devida importância, respeitados e considerados, sim, como parte do movimento estudantil.
Para conseguirmos articular as diferentes realidades da USP, são necessários mecanismos de comunicação eficientes. O site do DCE deve conter informativos e convocatórias para diversas atividades – sejam elas organizadas pelo Diretório, por grupos de estudo, de extensão ou centros acadêmicos. É preciso, ainda, um boletim virtual a cada CCA realizado, publicizando a todos as discussões realizadas – para que atinjamos o maior número possível de estudantes. Um jornal impresso do DCE também deve ser produzido, inclusive com textos de pessoas que não são da gestão – para que a entidade seja construída, não a chapa vencedora. Acreditamos que esses são alguns dos desafios para construir um DCE que dialogue para além da FFLCH e do Butantã; um DCE tomado pelos estudantes.
Articular-se com outros fóruns e com as outras categorias
O DCE também deve estar em constante contato com outros grupos que fazem política em questões mais específicas, como a Associação de Moradores do Conjunto Residencial da USP (AMORCRUSP) e as associações de moradores de complexos residenciais de outros campi, além de estudantes que lutam pela criação de residência em campi onde ainda não há. É preciso também diálogo com a Associação dos Moradores da São Remo e outros grupos fora da USP que realizam luta social, entendendo que a nossa luta por permanência estudantil/moradia é parte de algo muito maior, fazendo com que nosso alcance ultrapasse os muros da Universidade.
Além disso, o contato com outras categorias da universidade deve ser intensificado, através de reuniões abertas com o Sindicato dos Trabalhadores da USP (SINTUSP), com a Associação dos Docentes da USP (ADUSP) , com Associação dos Pós-Graduandos (APG-Capital), com o Núcleo de Consciência Negra da USP, entre outros.
Um dos maiores exemplos de articulação entre as categorias é o Fórum Aberto Pela Democratização da USP – responsável, atualmente, pela Campanha por uma Comissão da Verdade da USP. Congregando vários Centros Acadêmicos, o DCE, Sintusp, Adusp, além de diversos grupos políticos e independentes, o Fórum Aberto mostrou ser possível a unidade entre as categorias e diversos setores da Universidade, tendo em vista uma lúta conjunta. Esse espaço deve servir de exemplo para o Movimento Estudantil, ultimamente carente de momentos de unidade real.
A ocupação dos espaços
Ocupar o espaço público é ocupar a vida política da nossa universidade. A USP é uma universidade pública, que deveria ter seus espaços tomados por produções artísticas, debates políticos, atividades culturais. No campus Butantã, a sede do DCE fica ao lado do Bandejão Central e deve ficar aberta cotidianamente, não apenas quando há reuniões. Queremos que os estudantes ocupem de fato e com frequência aquele local, com café, com a exibição de filmes, saraus e, festas e happy-hours semanais. Além disso, acreditamos que é fundamental defender os espaços estudantis, em todas as unidades e todos os campi. São neles que vivenciamos parte importante da vida universitária.
As festas são momentos importantes para construir a sociabilidade necessária ao espaço universitário, para ocupar o espaço público, além de garantir o financiamento da entidade. Além disso, a contribuição dos Centros Acadêmicos também é importante para garantir a vida financeira do DCE, mas é fundamental que, em contrapartida, haja prestação de contas durante o ano para que os estudantes saibam como são as movimentações financeiras da nossa entidade. Se cobramos transparência da reitoria, também precisamos de transparência na gestão das nossas entidades. Por fim, pensamos que a produção de materiais do DCE, que resgatem a imagem da nossa entidade e de Alexandre Vannucchi Leme, como marcadores de página, adesivos e camisetas, é uma possibilidade para avançarmos na construção de um DCE presente.
O povo na universidade
Certamente, é possível dizer que a Universidade de São Paulo é, sob alguns pontos de vista, uma universidade de qualidade – mas para quem? A que serve a USP? Para apontar alguma resposta, exige-se que nos debrucemos sobre sua fundação: quais interesses permearam sua criação e qual o conceito de educação adotado durante seus 78 anos de existência. Faz-se necessário, sobretudo, entender que os questionamentos que fazemos atualmente vêm desde sua fundação e refletem um problema histórico, ainda que agravado por circunstâncias atuais.
A USP, assim como a Escola Livre de Sociologia e Política, surgiu como uma forma de preparar a elite paulistana para dirigir o país. A ideia era que essas instituições formulassem um projeto de sociedade assentado no pensamento liberal, cumprindo, portanto, um papel civilizatório.
Os primeiros limites desse projeto se mostraram quando a Universidade não conseguiu mais atender as demandas da classe média emergente, sofrendo pressão para uma expansão de vagas – iniciou-se, assim, uma primeira reflexão sobre o papel da Universidade. Em 1962, existia um amplo movimento pela democratização da Universidade, pensando um projeto para além das demandas das elites paulistanas, barrado pela ditadura.
Nós, do Universidade em Movimento, em contraposição a esse projeto, queremos uma universidade pública, popular, aberta e democrática. Somos contrários às privatizações em curso e à pressão colocada por fundações de apoio dentro da universidade, e alimentadas pela reitoria. O financiamento da universidade deve ser exclusivamente público, garantindo sua autonomia para a produção de conhecimento, e impedindo a interferência de interesses mercadológicos na produção acadêmica. A USP deve estar alicerçada nas demandas da maioria da população que a sustenta, tendo seu caráter público deve ser assegurado – ou melhor, conquistado verdadeiramente.
A universidade, quanto a seu espaço e a sua dinâmica, não é aberta à sociedade. Para transformar isso, defendemos a democratização do acesso à universidade, tanto através das cotas quanto pela necessidade de pensarmos expansão de vagas na USP e criação de mais universidades, visando o acesso universal.
Por todo o histórico da USP, sabemos que será muito difícil garantir a implementação de qualquer política que amplie o acesso à camada mais pobre da população em nossa universidade. Defendemos, no entanto, a implementação de cotas sociais e raciais no vestibular da USP. Para tanto, é fundamental construir essa pauta junto ao Movimento Negro – que já atua na USP, com o Núcleo de Consciência Negra e a Frente Pró-Cotas, dos quais o movimento estudantil não deve se apartar.
Acreditamos que cotas raciais e sociais são fatores imprescindíveis para democratizarmos a USP, que hoje é uma universidade quase homogênea em sua composição social e racial, garantindo equidade social e maior pluralidade na composição universitária. Por termos esse entendimento, entregamos uma de nossas cadeiras no CO ao Núcleo de Consciência Negra, por seu protagonismo na luta pelas cotas raciais na USP (e pelos direitos da população negra em geral), principalmente no ano de 2012, em que a discussão sobre as cotas está cada vez mais em voga.
Além do acesso, a permanência dos estudantes deve ser garantida. Atualmente a USP destina cerca de 3% de seu orçamento para todas as suas políticas de permanência e assistência estudantil, que envolvem moradia, subsídio alimentício e transportes nos campi. Um exemplo claro da insuficiência da atual política de permanência são os dados acerca da quantidade de vagas e bolsas de moradia: a USP disponibiliza apenas 1356 bolsas de auxílio moradia e 2703 vagas de moradia para o total de 88.000 estudantes.
As bolsas de auxílio moradia também têm um valor irrisório para a/o estudante que precisa se manter na Universidade (principalmente na Capital) e a situação piora quando tratamos de estudantes que são mães. A concessão do benefício de permanência também é feita de maneira suspeita, sem esclarecimento a respeito de quais são os critérios utilizados.
É necessário que o Movimento Estudantil construa uma proposta concreta de ampliação qualificada das políticas de permanência na universidade. Propomos a criação de um Fórum das Moradias, que se configuraria enquanto espaço privilegiado para articular e discutir propostas e encabeçar uma Campanha pela Permanência Universitária na USP, abarcando grupos e entidades para além do ME.
Essas considerações expressam que, para nós, reivindicar democracia na universidade vai além da exigência de uma revisão da estrutura de poder, mas significa, precisamente, o amplo acesso da população à universidade, a gratuidade ativa e a garantia de universidade de qualidade para o povo.
Mulheres na Universidade
A Universidade não está excluída do restante da sociedade e, portanto, não está imune às suas contradições, entre elas o machismo. A USP, portanto, ainda que seja considerada um “pólo de excelência”, reproduz e recria, desde a produção do conhecimento, até as políticas de permanência, o machismo e a misoginia.
Nesse sentido, é preciso que as mulheres se organizem também na Universidade. Em 2011, construímos ativamente o I Encontro de Mulheres da USP (EME), e participamos da Frente Feminista desde sua criação.
O EME foi um importante espaço para formulação política, articulação e ação das mulheres, sendo essencial para pensarmos coletivamente os problemas que as mulheres sofrem na Universidade, e mais: foi essencial para pensarmos em soluções para esses problemas.
O primeiro encontro tirou deliberações importantes, aprovadas também no XI Congresso dos Estudantes da USP. Essas deliberações devem ser levadas a cabo pela gestão do DCE, como campanhas contra trotes machistas, pelo aumento das bolsas de auxílio aos estudantes, além de uma campanha contra a violência sexista.
A pauta feminista é de suma importância, e deve ser levada adiante por todo o Movimento Estudantil, incluindo aí as entidades estudantis – DCE e Centros Acadêmicos -, não sendo, portanto, tratada como algo secundário.
Propomos, além de continuar a articulação da Frente Feminista, realizar também o II Encontro de Mulheres Estudantes da USP, para dar continuidade ao processo que se iniciou em 2011, de fortalecimento e ação unitária do Movimento Feminista na USP.
Diversidade sexual
Assim também em relação ao movimento LGBTT: devemos buscar os grupos que atuam na USP e que têm tido pouquíssima visibilidade. Vimos membros da atual gestão empenhados em divulgar o Encontro Nacional Universitário de Diversidade Sexual (ENUDS), mas não enquanto uma política do DCE. É preciso que essa seja uma política de gestão, e tocada pela Entidade, fazendo com que todo o Movimento Estudantil seja parte dessa pauta.
Comprometemos-nos a garantir discussões e a fortalecer os coletivos e grupos de trabalho que estudam gênero e sexualidade, além de outros temas que atravessam a vida universitária. O conhecimento sobre a história da USP e do movimento estudantil pode ser mais bem disseminado e fomentado através de debates abertos e de grupos de estudos e o DCE deve exercer um papel de articulador e divulgador desses grupos.
Gestão comunitária
No Conselho Universitário da USP os estudantes de graduação correspondem a 10% do total de docentes do CO, os de pós são 5% e há apenas três cadeiras para os servidores não-docentes. A USP está entre as universidades mais antidemocráticas do país, não respeitando sequer o artigo 56 da Lei de Diretrizes e Bases, segundo o qual a representação docente nos colegiados e na escolha de dirigentes não deve passar de 70% – e cada uma das outras categorias dispõem de 15%, como ocorre em 16 universidades federais. A UNIFESP e a UFMG são exemplos de universidades que adotam esse modelo.
Já outras 37 federais, como a UFSCAR e a UFRJ, estabelecem um terço de cadeiras para cada categoria. No 4º Congresso da USP, com a participação de estudantes, professores e funcionários técnico-administrativos, foi aprovada a defesa desse modelo paritário nas instâncias deliberativas da universidade e das unidades. Há, portanto, um acúmulo que precisa ser resgatado, além dos variados exemplos de universidades que devem ser estudados para que tenhamos clareza do que desejamos ao propor uma mudança na estrutura da universidade. O GT Estatuinte, grupo que estuda a estrutura de poder na universidade a partir de atas, artigos, entrevistas e outros materiais, exerce um trabalho imprescindível no sentido de fundamentar nossas bandeiras.
A busca por ampliar a participação de estudantes e servidores nas instâncias de gestão da universidade e das unidades exige estudo e diálogo com as outras categorias. Não basta partimos do pressuposto de que o modelo paritário é um ideal óbvio para todos e repetirmos exaustivamente essa palavra de ordem.
O processo de escolha do Reitor evidencia a necessidade de mudanças. Além dos candidatos restringirem-se aos professores titulares (o mais alto grau da carreira acadêmica docente), o colégio eleitoral (que no primeiro turno congrega menos de 2% da comunidade universitária), cai para cerca de 0,3% no segundo turno, no qual os professores titulares representam cerca de 85%. Como se não bastasse, a decisão final é tomada pelo Governador do Estado, que escolhe entre a lista tríplice que lhe é enviada. Isso fere a autonomia universitária, pois o reitor será aquele com afinidades políticas e ideológicas com o Governo do Estado. Além disso, o fato de o governador ser aquele que escolhe o reitor não significa que há um “controle social” da Universidade, pois isso demandaria uma mudança de toda sua estrutura, que é extremamente conservadora.
Como no próximo ano teremos eleições para reitor, é imprescindível que o ME se articule com as demais categorias para se posicionar diante desta questão, através de um debate aprofundado de nossas estruturas e da reivindicação de ampliação da participação neste processo, atrelada à luta por uma estatuinte soberana.
Memória, verdade e justiça para democratizar a Universidade
Hoje, uma das pautas de maior destaque em toda a sociedade brasileira é a necessidade de recuperarmos nossa memória nacional do período da Ditadura Militar, através da Comissão da Verdade Nacional. Dentro da USP não é diferente. Nossa Universidade foi palco de inúmeros acontecimentos durante o período da Ditadura, com a cassação, eliminação, prisões, assassinatos, demissões e aposentadorias compulsórias de estudantes, professores e funcionários técnico-administrativos. Estima-se que dos aproximadamente 500 desaparecidos políticos durante a ditadura, 40 eram funcionários, professores ou alunos da USP, além da truculência ocorrida durante a invasão e depredação da Faculdade Maria Antônia e a invasão do CRUSP em 1968, com a prisão de mais de 800 estudantes.
Nesse sentido, faz-se necessária a criação de uma Comissão da Verdade da USP – campanha encabeçada pelo Fórum Aberto pela Democratização da USP, sobre o qual já falamos anteriormente -, para que esses acontecimentos sejam revistos, e os fatos investigados e apurados. Essa Comissão serviria para pensarmos também a estrutura de nossa Universidade, e como a forma como ela é hoje baseia-se num modelo autoritário de sociedade – como o regime disciplinar feito em 1972, que ainda hoje legitima e baliza processos e expulsões.
Uma Comissão da Verdade é, portanto, parte do nosso resgate nacional, coloca o povo brasileiro como sujeito histórico, protagonista das mudanças sociais, reivindicando seu direito de rever os fatos históricos, abrindo a possibilidade de construirmos um outro futuro.
A ampliação das discussões sobre modelos de gestão e o estatuto das instituições da universidade devem construir um processo estatuinte, apontando propostas concretas, como ocorreu no 4º Congresso da USP. Nesse sentido, também é urgente o empenho em organizar um novo Congresso da USP, junto aos docentes e funcionários.
A universidade para o povo
Por fim, ao defender o povo dentro da universidade, defendemos simultaneamente a produção de conhecimento para o povo, não para o mercado. A extensão sofre uma carência de popularidade na USP, pois rompe com a lógica atual de uma aprendizagem que se realiza apenas nas salas de aula. Vai além porque ela só se realiza enquanto tal quando conseguimos sair dos muros da universidade e aprender para além dela. Está além das perspectivas da sala de aula e dos objetivos das pesquisas acadêmicas. Quando falamos de extensão, falamos em rever o cotidiano e em lidar com o que é diário com outro olhar: o de estender nosso conhecimento e nossas técnicas e de reformulá-las coletivamente.
Colocar a Universidade em Movimento é colocar as demandas e os saberes populares na ordem do dia das produções e dos viveres acadêmicos, e no cotidiano de toda uma sociedade, que carece de perspectivas reais de mudança social, econômica e política, para sua real emancipação.
Os grupos de extensão que temos hoje têm um papel fundamental e devem ser estimulados. Afinal, também é com o apoio dos movimentos sociais da cidade e do campo que teremos mais forças para obter vitórias, e a extensão universitária é fundamental para estabelecer essa relação, entre a Universidade e os Movimentos Sociais. Dessa forma propomos e defendemos também a realização de uma Semana de Movimentos Sociais, abrindo um espaço para maior conhecimento de outras realidades e de outros grupos que também lutam por uma sociedade mais justa e igualitária, e para fomentar esse diálogo.
No que tange à educação no âmbito nacional, o novo Plano Nacional de Educação que está em debate no Congresso contém as diretrizes para a educação durante os próximos dez anos e versa sobre seu financiamento. Infelizmente, a proposta que está tramitando apresenta uma série de problemas. Além de abrir as portas para a privatização da educação, desconsidera critérios básicos para garantia da qualidade educacional, como o CAQ (Custo Aluno Qualidade) ou a diminuição de estudantes por salas de aula. No entanto, os 10% do PIB em investimento na educação, exigência do Plano elaborado pela sociedade civil desde a década de noventa, foram aprovados recentemente na Comissão Especial do Plano Nacional de Educação na Câmara. Somos favoráveis a essa pauta, e agora é preciso fazer pressão política e popular para que os 10% sejam efetivados.
A educação pública, gratuita e de qualidade é um direito inalienável, previsto na Constituição, e o Estado deve garanti-lo. Mesmo em um país rico como o Brasil, hoje sexta economia do mundo, ainda investimos muito pouco em educação (cerca de 5% do PIB). Em 2009, o governo gastou 44,93% de todo o orçamento da União com o pagamento de juros, amortizações e com a rolagem da dívida pública. Só em 2011, foram R$ 230 bilhões gastos em juros da dívida, o que torna injustificável argumentar que não há verbas para investir um total de R$ 450 bilhões em dez anos para a educação.
Lutamos por outra lógica para a educação no país: inclusiva, crítica, gratuita, pública e socialmente referenciada. Para isso, exigimos que o Plano Nacional de Educação garanta ao menos os 10% do Produto Interno Bruto nesta área. É nosso desafio enquanto movimento social pressionar o poder público em relação a essa questão e trazê-la para a discussão na sociedade civil.
Todas essas considerações devem ser tomadas como um desejo de mudança não só da universidade, mas de toda a sociedade. A reivindicação por mais moradias estudantis representa um ideal de melhores condições de habitação para todos os cidadãos. A luta contra o machismo, o racismo e a homofobia e pela desmilitarização da polícia militar são bandeiras dentro da USP e fora dela.
A desmilitarização da polícia foi, inclusive, uma recomendação do Conselho de Direitos Humanos da ONU para o Brasil no último mês de maio, pois os países daquele órgão entenderam que o Brasil deve combater a atividade dos “esquadrões da morte” da Polícia Militar. Acreditamos que essa instituição não exerce o papel de garantir a segurança da população. Pelo contrário, é um instrumento repressor, principalmente na periferia.
A recente ocupação da favela de São Remo, vizinha do Campus Butantã, evidencia a violência com que a polícia e o governo do estado de São Paulo tratam a camada mais pobre e negra da população. Neste caso também está presente uma pretensão higienizadora, como se viu na operação no bairro da Luz, do centro da Capital. É preciso que o ME atue em conjunto com os movimentos que pautam esse debate, como o Movimento de Moradia e o Movimento Negro, bem como movimentos de direitos humanos, para termos uma dimensão maior sobre a questão.
Nesse sentido, também somos contra a censura e a punição à expressão política, cuja consequência na USP foram mais de 70 processos contra estudantes, e a eliminação/demissão por motivos políticos de estudantes e funcionários no último ano, cuja base legal é o decreto já citado antes, da época da Ditadura Militar, que não foi suprimido na reforma estatutária ocorrida no processo de democratização de nosso país.
Estudantes em movimento por um DCE em movimento!
Por todos esses motivos que elencamos, fizemos esta chapa. Queremos mudar a Universidade, e sabemos que isso só é possível através da nossa força, da nossa mobilização, através de muita gente atuando coletivamente. Por isso, é preciso que tenhamos uma entidade participativa no cotidiano dos estudantes, que dialogue com as entidades de base e consiga chegar, de fato, a toda USP. Mais do que centenas integrantes, temos muita vontade e um plano concreto de como colocar nossas ideias em prática, levando em consideração a quantidade de pessoas e a diversidade de realidades da USP. O Movimento Estudantil precisa se reformular, encontrar novas formas, construir-se de forma ampla e plural. Só dessa maneira conseguiremos construir a Universidade que está em nossos sonhos, em nossos desejos e em nossas necessidades.
Para todos juntos construirmos um novo tempo, a Universidade tem que estar em movimento!